O relato não é apenas meu. Era comum ver o professor Ruy Fausto murmurando pelos corredores. Mesmo quando ia estudar na biblioteca, punha-se a ler Marx aos sussurros, como se, de pronto, ao texto respondesse — assim nos exigem em filosofia: ler o texto em guarda, para perguntar-se pelo sentido de quase tudo que no texto aparece. Ruy Fausto parecia levar o adágio a ferro e fogo, e, como monge medieval (baixo, curvado, penitente), orava em cima do li vro e repetia, para si mesmo, à biblioteca e aos corredores, aquelas orações. Exagero, claro. Mas é que assim a coisa me parecia. Não era oração, evidente, sobretudo pelo texto ser, em primeiro lugar, filosófico, em segundo lugar, de Marx. Talvez era esse o sinal ético da profundidade de pensamento, que logo é percebida nas primeiras páginas de Marx: lógica e política , que li de maneira selvagem e aos trancos, para uma entrevista da qual, no fim, não participei. É int...